Ecos do Passado
O som da chuva batia na janela quando o detetive Augusto recebeu o telefonema. Uma voz feminina, trêmula, pediu ajuda para encontrar uma mulher desaparecida. O nome soou como um trovão em sua mente: Clara Mendes.
Por um instante, o tempo parou.
Clara. O amor que ele deixara escapar há vinte anos, quando o dever falou mais alto que o coração.
Tentou disfarçar o impacto, mas as memórias voltaram com força: o riso dela, o perfume de jasmim, o toque leve nas tardes de domingo. Ainda assim, anotou o pedido com a calma de um profissional.
— Envia os detalhes por e-mail — disse, tentando manter a voz firme.
Na manhã seguinte, recebeu a pasta do caso. Lá estava a foto. Clara, mais madura, mas inconfundível. O mesmo olhar doce, agora marcado por uma sombra de melancolia.
Ela havia desaparecido três dias antes, após visitar um orfanato onde trabalhava como voluntária. Nenhum sinal de fuga, nenhum indício de crime. Apenas ausência.
Augusto retomou seus instintos antigos. Visitou o orfanato, falou com as crianças, analisou registros de câmeras, caminhou pelas ruas que ela costumava frequentar. Cada passo reacendia algo adormecido.
No ateliê abandonado atrás da igreja, encontrou o primeiro vestígio: um diário. Nas páginas, Clara escrevia sobre uma busca — não por outra pessoa, mas por si mesma. Falava de arrependimentos, de escolhas, e de um homem que ainda morava em suas lembranças.
“Se ele soubesse que ainda penso nele… talvez o destino tivesse sido outro.”
As palavras queimaram no peito de Augusto.
Ele soube, naquele instante, que ela o esperava — mesmo que não dissesse.
Seguindo uma pista deixada no diário, foi até uma casa antiga à beira do mar, onde Clara costumava pintar. A porta estava entreaberta. Dentro, o cheiro de tinta fresca misturava-se ao da maresia.
Ela estava ali.
De pé, diante de uma tela inacabada, com o olhar perdido no horizonte. Quando o viu, sorriu com a mesma ternura de duas décadas atrás.
— Eu sabia que você viria — sussurrou.
Augusto não respondeu. Apenas se aproximou e segurou a mão dela, como quem encontra um pedaço perdido da própria alma.
O silêncio entre eles dizia mais que qualquer palavra. Não havia passado nem futuro, apenas aquele instante suspenso — um eco de tudo que poderiam ter sido.
Lá fora, a chuva cessou. O céu se abriu em tons de laranja e ouro.
Augusto entendeu, então, que algumas buscas não são por pessoas, mas por nós mesmos.
E às vezes, reencontrar alguém é a forma mais bela de se perdoar.
“Esta obra é uma ficção. Qualquer semelhança com nomes, pessoas, fatos ou situações da vida real terá sido mera coincidência.”