Quem quer vir pra Salvador está encontrando um obstáculo e não é mais a pandemia: é o preço das passagens aéreas. A servidora municipal e designer de interiores Marcela Cerqueira, de 40 anos, teve que abandonar os planos de visitar a cidade no final do ano. O motivo da viagem era passar o Natal e Réveillon em família depois de dois anos de pandemia. Ela mora em São Paulo com o marido e conta que a ida e volta de cada um para Salvador custaria cerca de R$ 2 mil. A depender do ponto de partida, os valores são ainda mais elevados; as passagens com saída de outras capitais brasileiras passam dos R$ 3mil.
Marcela e o marido vieram a Salvador agora em setembro e os preços estavam bem mais em conta. A passagem de ida e volta de cada um custou cerca de R$ 490. Quando foram pesquisar a passagem para as festas de final de ano, o susto foi grande. A gente olhou outros destinos e vimos que, a depender do período, é mais barato viajar para Argentina do que para Salvador. Isso deixa a gente triste porque temos que deixar de ver nossos parentes por causa desses preços abusivos, diz Marcela.
A servidora municipal diz que não tem como arcar com os valores atuais e que, a não ser que consiga uma promoção, vai tentar viajar em fevereiro de 2022, quando os preços, por enquanto, estão mais baixos. Acabamos desistindo. Para passar o Natal e o Réveillon em família, agora só se aparecer uma promoção muito boa, finaliza. A vice-presidente da Associação Brasileira de Agências de Viagens Seção Bahia (Abav-Ba), Ângela Carvalho, confirma os altos preços. Com a pandemia, as companhias aéreas reduziram a quantidade de voos, então hoje temos poucos voos e uma alta demanda nesse processo de retomada. Os voos estão cheios, lotados, e isso gera o aumento, os preços estão absurdos mesmo, coloca.
O analista judiciário Gustavo Henrique Oliveira, de 43 anos, também é baiano e está morando no Rio Grande do Norte. Ele está pesquisando preços de passagens e ainda não sabe se ele, a esposa e o filho vão conseguir passar o Natal com a família aqui em Salvador. No ano passado, a viagem custou no total R$ 3.500; este ano, não está saindo por menos de R$ 5 mil. Queremos ir, pois meu pai está bastante debilitado em razão da diabetes e também para rever todos os meus irmãos e sobrinhos após esses dois anos de afastamento por conta da pandemia, mas os preços praticados pelas companhias aéreas estão impeditivos, diz ele.
Gustavo conta que para complicar a situação, a maioria dos voos têm conexões e paradas, tornando a viagem com uma criança de 3 anos ainda mais cansativa. Viajar de carro não está nos planos, pois o custo do combustível está muito alto, além de ser mais cansativo ainda, afinal são mais de 1.200km entre a capital potiguar e a baiana, acrescenta.
E o problema não está sendo enfrentado somente para quem busca voos domésticos para Salvador. A estudante Kamila Souza, de 21 anos, que mora em Portugal, não passa o Natal em família desde 2018. Em 2021, mais uma vez o plano vai ser adiado. Entre agosto e outubro deste ano, a passagem de ida e volta para Salvador estava custando R$ 1.900; para o final do ano, o salto é grande. No ano passado, ida e volta para o Natal estava custando R$ 5 mil e eu não fui porque já achei caro. Agora em 2021 está R$ 7 mil, então também não vai dar, diz ela.
Esse preço é para viagem entre o final de dezembro e início de janeiro, quando Kamila tem disponibilidade de ir. Ela conta que fez uma pesquisa e notou uma grande variação de valor conforme a alteração das datas. No início de dezembro e no final de janeiro os preços estão mais baratos. As passagens caem para uma média de R$ 2 mil a R$ 3 mil cada trecho, mas eu tenho aula nesse período.
A jornalista baiana Paloma Jacobina, de 41 anos, mora na Holanda e também se assustou com o preço das passagens para cá no final do ano. Estou acompanhando os preços desde cedo. Antes da Europa abrir para brasileiros, em maio, a passagem para Salvador estava custando cerca de 400 euros. Quando eu comprei, em setembro, já não encontrei nada por menos de 700 euros, diz.
Paloma tinha o costume de visitar a família ao menos uma vez ao ano, mas, com a pandemia, não vem para Salvador há dois anos. O último Natal aqui foi em 2017. Em 2019, deixou a visita para março, já tinha comprado passagem, mas a pandemia interrompeu os planos. Por isso, decidiu enfrentar os altos preços agora e vir mesmo assim. A estratégia foi viajar em novembro e voltar no dia 31 de dezembro já que, depois dessa data, os valores ficavam ainda mais caros. A gente decidiu ir só para o Natal, voltamos na noite do dia 31. Ou era isso ou teríamos de ficar até o final de janeiro, quando a passagem ficava um pouco mais barata, acrescenta.
Outro baiano que mora fora e preferiu não ter o nome revelado, também encontrou o mesmo problema. Ele, que foi morar na Suécia durante a pandemia, diz que comprou passagem para vir para Salvador em novembro e vai retornar no dia 30 de dezembro. Para dois adultos e uma criança eu estou pagando cerca de R$ 16 mil. Quando eu procurava a volta para janeiro, o valor do trecho ficava mais caro do que ida e volta juntas ainda em dezembro, conta.
Por que os preços das passagens estão mais caros?
Segundo o também vice-presidente da Abav-Ba, Jorge Pinto, a justificativa envolve a redução do número de voos durante a pandemia e o recente aumento da demanda. A malha ainda não está com capacidade 100% porque, com a pandemia, houve redução. A demanda está começando a subir e a oferta de voos ainda está baixa, então é um incentivo para aumentar os preços. E houve prejuízo na pandemia, ou seja, agora é o momento das companhias buscarem uma recuperação, acrescenta.
A Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear), afirma que o preço do querosene de aviação (QAV) registrou alta de 91,7% no segundo trimestre deste ano, em relação a igual período do ano passado, segundo os dados mais recentes da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). A escalada da cotação do dólar em relação ao real, também tem influência nos preços. De acordo com a Abear, 51% dos custos do setor são indexados pela moeda estadunidense.
O mais recente levantamento da Abear sobre o querosene de aviação revela que, no primeiro semestre de 2021, o preço médio do combustível na bomba, no Brasil, foi 24,6% superior do que nos Estados Unidos. O Brasil é o único país do mundo que tem um tributo regional sobre o QAV, o ICMS. As companhias estrangeiras, por sua vez, não pagam esse imposto para abastecer em território nacional. É por isso que uma viagem internacional muitas vezes é mais barata do que um voo doméstico, considerando-se distâncias similares, afirma o presidente da Abear, Eduardo Sanovicz.
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