Mário Peixoto (1910-1992)
Um homem e duas mulheres, num barco em alto mar. Esgotados, param de remar, abandonando-se à própria sorte. À deriva, relembram o passado. Este enredo simples é do filme Limite, de Mário Peixoto, uma referência do cinema brasileiro. O mitológico longametragem foi lançado em 1931 e inspirou outros criadores a realizar trabalhos fora das convenções narrativas adotadas internacionalmente, e a buscar uma linguagem nova e coerente com a cultura brasileira. O filme encantou críticos e espectadores europeus, inclusive o cineasta soviético Sergei Eisenstein e representa, ao lado de Ganga Bruta, de Humberto Mauro, o ápice do cinema mudo nacional.
Incompreendido no seu tempo, o primeiro gênio do cinema brasileiro nasceu no Rio de Janeiro e passou parte da juventude em Londres e Paris. Lá entrou em contato com os movimentos de vanguarda europeus, o cinema revolucionário soviético e o expressionismo alemão, que tiveram influência decisiva sobre o seu trabalho. Limite, seu único filme concluído, apóia-se quase integralmente na força das imagens. Já na sua estréia, Limite foi classificado como misterioso, maldito e sublime. Numa época em que a Cinédia começava a produzir comédias musicais fiéis ao modelo americano, Peixoto apresentou uma obra insólita, que sequer foi exibida comercialmente, por causa da reação negativa da crítica na sessão inaugural, promovida pelo Chaplin Club.
Atualmente, sua importância e pioneirismo são amplamente reconhecidos. O filme, Limite trouxe enormes inovações de linguagem, com seu ritmo lento, suas belíssimas imagens de paisagens tipicamente brasileiras e um trabalho revolucionário de câmera, que combina enquadramentos estáticos com movimentos vertiginosos, pontuados por uma trilha sonora erudita. Durante décadas, Limite foi muito pouco visto, porque a única cópia existente estava guardada num cofre da Faculdade Nacional de Filosofia do Rio de Janeiro. Isso contribuiu para que se transformasse numa lenda, cujas virtudes reais só puderam ser apreciadas nos anos 80, depois de cuidadosa restauração.
Também poeta e romancista, Mário Peixoto passou a maior parte da vida recluso em Angra dos Reis, litoral fluminense. Deixou três filmes inacabados, Maré Baixa, Três Contra o Mundo e Onde a Terra Acaba. Colaborou, anonimamente, no roteiro de Estrela da Manhã (1950) e não conseguiu levar adiante, na década de 50, um projeto intitulado A Alma Segundo Salustre, cujo roteiro foi editado em livro em 1983.
Mário Peixoto morreu em 1992.
Fonte:Livro 100 Brasileiros (2004)